Teoria da Literatura e Criação Literária

por Marcelo Spalding

Como professor de criação literária, uma das perguntas que mais preciso responder é: será que uma oficina não irá padronizar meu texto, deixá-lo quadrado demais, limitar minha criatividade? E para argumentar que não, sempre lembro a meu interlocutor que muitos dos escritores contemporâneos conhecidos e/ou reconhecidos são não apenas oriundos de oficina, como também têm formação acadêmica na área de Letras ou criação literária, como Milton Hatoum, Cíntia Moscovich e Daniel Galera.

Isso me leva, então, a uma segunda pergunta: de que forma a teoria literária - termo hoje tão debatido pela própria academia - pode contribuir com o aspirante a escritor, sem limitá-lo mas dando-lhe algum norte, apontando algum caminho a ser seguido?

Primeiramente, acho fundamental que se pense sobre o papel da teoria (e da academia) na sociedade, especialmente na arte. A teoria não pode ser NORMATIVA, apontando o que é correto ou não, o que pode ou não pode; a teoria não deve se colocar como "guardiã" de algo. A teoria deve ser DESCRITIVA, olhando para os inúmeros fenômenos criativos e tentando compreendê-los, criando e recriando categorias capazes de ajudar na observação desses fenômenos de forma a perceber neles algumas constantes, o que tais constâncias podem nos dizer sobre a vida, a arte ou a sociedade de determinada época.

Acredito que assim como conhecer a si mesmo é importante para a vida pessoal, conhecer o mais profundamente possível nossa área de atuação é fundamental para o crescimento da própria área. Mas não se pode falar em conhecimento ou aprendizado quando para fazer teoria escolhe-se meia dúzia de obras ou fenômenos e relegamos o resto a segundo plano, à margem. É preciso que a academia, que a teoria, olhe para todos os fenômenos, olhe de forma interessada, sem preconceito, ainda que sem benevolência. É preciso que sejamos humildes para aprender com os best sellers, com os bravos desconhecidos que publicam seus livros, com o sucesso do momento da Amazon e também com os grandes clássicos - que até aqui chegaram com esse rótulo por algum motivo. Assim a teoria cresce, a academia cresce, a literatura cresce.

Entretanto, se tal concepção libertária para a teoria ajuda na análise, na pesquisa e na docência sobre literatura, é diferente para os interessados em criação literária, pessoas que querem produzir literatura, participar desse meio, publicar um livro, serem lidas e eventualmente elogiadas, aplaudidas, premiadas. Para elas, até se pode relativizar o que seja um "bom texto", mas elas procuram um curso ou uma oficina literária porque elas querem escrever "melhor", têm uma ideia de "melhor" em suas cabeças. É mais ou menos como quem procura um psicólogo para saber como viver "melhor", quem procura um nutricionista para se alimentar "melhor", quem procura um personal trainer para ter um corpo "melhor". Por mais subjetivo que seja esse "melhor", faz parte de um imaginário social e é preciso levá-lo em conta para ajudar aqueles que procuram um curso de criação literária.

Assim, avançando na reflexão, eu diria que podemos, sem ignorar as profundas e produtivas reflexões sobre padrões estéticos, sobre a própria natureza da literatura e sua teoria, criar alguns parâmetros para definir o que seja um texto "melhor" considerando os padrões contemporâneos. E deixar claro que são parâmetros particulares, sujeitos a questões ideológicas e de gosto, mas também parâmetros balizados por anos de estudo, leitura e reflexão.

 

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